Blog do Luiz Fernando

CANSEI de tentar modificar a Constituição deste País. Toda discussão sobre política hoje é contraproducente. E o negócio é produzir. Bola pra frente. Como a propaganda é a alma do negócio, sou advogado, faço contabilidade, e atendo 6h por dia no escritório e 24h por dia na internet. Um dia chego onde quero. E O QUE EU QUERO MESMO É VOLTAR PRO SERVIÇO PÚBLICO...

05 abril 2006

O Estado de Direito e o Direito de Resistência

Estou escrevendo estas linhas apenas por um motivo: a curiosidade de um amigo meu federalista, há pouco tempo atrás, por ler em meu último artigo sobre a existência de um direito de resistência. Como o tenho como pessoa bastante culta, posso considerar esta curiosidade extremamente válida, apesar de constatarmos que certas idéias acerca de conceitos juspolíticos imprescindíveis para a existência de uma democracia foram perdidas. Podemos concordar que trata-se da mais pura verdade, tendo-se em vista os bombásticos acontecimentos que assolam o país no campo político-jurídico. Há, ainda, que se cotejar o direito de resistência com outro conceito, o de Estado de Direito, este que se encontra tão combalido nos dias atuais, por ser abordado de forma tortuosa.
Duas das grandes Nações do mundo têm em sua Constituição um conceito de direito de resistência, a saber, Portugal - com quem nós brasileiros temos estreitos laços, o mais considerável deles o linguístico - e a Alemanha, desde a Constituição Federal de 1946, vigente até hoje. O art. 21 da Constituição de Portugal dispõe: “todos tem o direito de resistir a qualquer ordem que ofenda os seus direitos, liberdades e garantias e de repelir pela força qualquer agressão, quando não seja possível recorrer à autoridade pública”. Já a Lei Fundamental de Bonn explicitou-o no art. 20, al. 4, asseverando que “todos os alemães têm o direito de resistência, se não for possível outro recurso, contra quem tentar subverter essa ordem” (a ordem fundamental liberal democrática).
No Brasil, um dos poucos autores que escreveram a seu respeito foi o mestre paraense Zeno Veloso, que o faz com clareza meridiana, asseverando que “o direito de resistência é a última fronteira, o recurso derradeiro, que tem o indivíduo de garantir sua liberdade, seus direitos, suas garantias, diante de atos do poder público (...).Baseado no princípio de que ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei (CF, art. 5º, II), o indivíduo (agindo isoladamente ou em grupo) pode opor-se aos detentores do poder que expeçam ordens que infrinjam ou violem direitos constitucionalmente assegurados. O direito de resistência é um direito natural, suprapositivo, quem nem precisa vir expresso”.
Por outro lado, na concepção atual dos Estados nacionais modernos, está o conceito de Estado de Direito (e não o de Estado Democrático de Direito, como erroneamente esculpido na Constituição Federal Brasileira de 1988). Em síntese, Estado de Direito é aquele em que está firmemente estabelecido o império da Lei, expressão do consenso geral, pela qual todos são igualmente protegidos, bem como sua vida, liberdade e propriedade, e perante ela vedada quaisquer outras distinções e privilégios. Estas, em rápidas pinceladas, as lições de Locke, Rousseau, e Montesquieu, citando referências da filosofia política, neste tema mais que surrado, e entretanto não bem assimilado no país, onde assistimos mais uma vez embasbacados ao desvanecimento do Estado de Direito, e ao clima de vale-tudo que impera.
Como conciliar então o Estado de Direito com o direito de resistência? Se claro está que a Lei é injusta, ou que a atuação da autoridade pública (o que, em nosso regime republicano, significa dizer qualquer autoridade pública, ou seja, qualquer pessoa dotada de poder público e que tire qualquer tipo de vantagem - a grande maioria das vezes, patrimonial - desta posição) não tem se pautado de acordo com o império da Lei Fundamental, que vale para todos, autorizado estaria qualquer indivíduo para reagir, de chofre? Não é bem assim. Embora autorizados a repelir agressões injustas, imediatamente, há que se observar, como o faz Zeno Veloso, que trata-se de “um meio não-jurisdicional de amparo, uma manifestação de legítima defesa, e que deve ser utilizado subsidiariamente, à medida em que, no Estado de Direito, é no recurso ao Judiciário que o indivíduo deve buscar, normalmente, o socorro e a prestação diante do arbítrio”.
Nesses 17 anos de vigência da atual Constituição Federal, o brasileiro aprendeu a reclamar seus direitos ao Poder Judiciário. Por este motivo, ao lado do Ministério Público, este passou a ocupar lugar de absoluto destaque dentre as instituições nacionais, tornando-se imprescindível, o que acarretou, por um lado, sua sobrecarga, e por outro lado, sua modernização em maior grau dentre todas as funções de Estado. Entretanto, a quem recorreremos, se o Poder Judiciário, a par dos outros, vê expostas suas mazelas - tais quais o nepotismo, o clientelismo e a morosidade - enquanto o acesso a este e a liberdade para julgar foram embotados pelas inúmeras reformas à Constituição Federal, e ao anacronismo absoluto do resto da legislação? Qual o modelo de Judiciário que queremos para o Brasil? Este em que todos os processos acabam invariavelmente julgados nas mesmas gavetas em Brasília? Ou uma justiça comunitária, rápida, eficaz, baseada no consenso, julgada nos Estados em que as questões surgem, por sua própria gente? São estas as questões, abordadas pelo Movimento Federalista, que deverão brevemente ser resolvidas no Brasil.

1 Comments:

  • At 4:59 PM, Blogger Homero Moutinho Filho said…

    Excelente texto. Aliás, me fez lembrar de uma frase sua , num dos tópicos de nossa comunidade no Orkut (Movimento Brasil Nova Nova) ; “o Estado é uma abstração escrota ” , com a qual concordo plenamente. Citaria, do mesmo modo, nossos dois manifestos; “Baratas e Baygon” e “Manifesto dos 13 pontos”, como provas de que muita coisa poderia ser mudada, caso estivéssemos num Estado de Direito e não um de Fato, como testemunhamos, pela podridão generalizada, que levou de roldão todas as instituições e poderes.
    Tal estado de coisas, impede que possamos, por procedimentos constitucionalmente amparados, promover quaisquer reformas, pois, de “baratas” (crápulas infratores e quadrilhas que aparelharam o Estado), nada poderemos esperar, somente brutal resistência contra ameaças aos seus privilégios e poderes.
    A OAB e o Judiciário estão desmoralizados e submissos.
    Não há mais condições para resistências intelectuais do que restou de uma classe média sem poder de mobilização concreta.
    Estamos diante de dois cenários prováveis; um populismo ditatorial de esquerda ou um golpe militar, desta feita sangrento.
    Pois que venha o caos.

    Abs

    Homero Moutinho Filho

     

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